Clubhouse é excludente, assim como quase todos os outros aplicativos!

Karen Santos
4 min readFeb 8, 2021

Clubhouse é uma espécie de “podcast ao vivo“: os usuários podem acessar diversas salas e acompanhar conversas de outras pessoas sobre qualquer assunto. Você pode ser chamado para o ‘palco’ e falar ou apenas ficar como ouvinte e ver quais são as outras pessoas que estão na sala. Tudo é por voz: não há textões, curtidas, compartilhamentos, nada disso… ou você está falando, ou está escutando alguém.

Tenho visto muitas pessoas falarem sobre o quanto o Clubhouse é excludente e inacessível, mas as mesmas pessoas possuem a memória curta ou fecham os olhos para a profundidade de todos os outros aplicativos que já usamos diariamente.

No Clubhouse por exemplo, para ter acesso ao app, é necessário que você receba um convite de quem já está utilizando, tenha um dispositivo IOS e possa utilizar o recurso apenas de audição e fala, além disso toda sua interface e navegação está em inglês.

Em um país onde:

  • 25% da população tem algum tipo de deficiência
  • 9 em cada 10 brasileiros usam celular Android
  • Cerca de 47 milhões dos brasileiros não possuem acesso a internet
  • Menos de 1% dos sites brasileiros são acessíveis para pessoas com deficiência.
  • Menos de 14% das imagens dos app tem acessibilidade
  • Apenas 5% dos brasileiros falam inglês

Vejamos outros exemplos:

TikTok

O TikTok, por exemplo, saiu na The Intercept por ocultar vídeos de pessoas “feias” (fora do padrão que definiram como aceitável) e ocultavam vídeos gravados em fundos de favela.

Tinder e apps de relacionamento

Você já se perguntou como o Tinder seleciona a próxima carta? É possível escolher aleatoriamente?

A resposta é não, os usuários nunca podem ver a pessoa em que estão interessadas sem fazer o swipe (arrastar para o lado). O Tinder desenvolveu um algoritmo, em termos simples, onde todo mundo tem uma pontuação.

Quanto maior a pontuação, mais cedo será a classificação e também atenderá a fatores como localização geográfica e orientação sexual. Porém, como esses algoritmos são baseados em atratividade, atividade e escolha, tem sempre um “tipo específico” de pessoas que não são atrativas, ou escolhidas.

Um estudo realizado usando estatísticas de correspondência do site de namoro OKCupid de 2009 a 2014, por exemplo, mostra as menores taxas de aprovação para homens asiáticos, mulheres negras e latinas (a exceção: mulheres asiáticas). Isso ocorreu apesar de um número crescente de usuários do OKCupid alegar que não têm uma forte preferência até o momento dentro de sua raça.

Vidas entregues — Carros, comida e limpeza via app

Aplicativos de entrega de comida, corrida de carro e contratação de diaristas, onde em sua maioria quem entrega o serviço são pessoas pretas e periféricas, com pouquíssimo suporte da plataforma, sem vínculo algum e muito suporte para a ponta que adquire o serviço.

Esses são os sintomas do subemprego e da vulnerabilidade econômica que são mais sentidos pela classe mais pobre, composta, majoritariamente, por pretos, pardos e mão de obra “bem usufruída” pelos aplicativos. Uma pesquisa de perfil feita em São Paulo pela Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike) apontou que 71% dos entregadores são pretos e pardos.

Algoritmos racistas

Também temos os aplicativos de reconhecimento de face como o FaceApp, que quando não nos deixa mais claros, nos matam e nos condenam?

Há ainda a estatística de que 90% dos presos por esses sistemas de reconhecimento facial no Brasil são negros. O MIT fez um estudo demonstrando que sistemas de reconhecimento facial possuem um erro médio de 0,8% para homens brancos, mas podem chegar até 34% ao reconhecer mulheres negras.

Eu baixei o Clubhouse e realmente não é acessível, não é inclusivo, assim como a maioria dos apps digitais, desenvolvidos por equipes homogêneas, por empresas que determinam exatamente quem é o seu público, para nós pessoas pretas e periféricas ou de origem periférica isso não é nenhuma novidade. Talvez o app crie a versão para Android, talvez pensem na acessibilidade, ou talvez no fim do dia seja isso mesmo, mas e você, o que tem feito para que o seu produto digital não seja excludente e inacessível, lá na sua empresa, startup, consultoria? E nós, enquanto UX Designers, estamos pensando na melhor experiência, na acessibilidade real, na diversidade nos produtos, serviços e soluções?

Outros links:

Sigam https://medium.com/uxmpretas, estamos tentando diminuir de algumas formas cenários como todos esses acima.

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